
Por Carlos T. Moura
Aconteceu num sábado, 19 de fevereiro de 2010.
O colunista político do Globo, Merval Pereira, e o blogueiro Augusto Nunes, da revista Veja, sob o ímpeto de uma revolta contra a eleição do deputado João Paulo Cunha para presidente da Comissão de Justiça da Câmara de Deputados, fizeram, à sua maneira, uma das maiores afrontas ao estado de direito do país.
Desqualificaram instituições, desconheceram trâmites da justiça, zombaram de eleitores e decidiram condenar publicamente um político antes da suprema corte se pronunciar.
Desprezaram a eleição legítima de um deputado federal, com 255 mil votos. Na enxurrada, omitiram a diplomação do mesmo na Justiça Eleitoral.
João Paulo Cunha foi denunciado no esquema do “mensalão”. Ou seja, já é culpado!
Quanto ao poder executivo, não é preciso dizer, repetiram o papel serviçal que exercem a mando de seus patrões.
Merval Pereira, no artigo “Manobra petista”, munido do argumento de que o fato é um menosprezo à opinião pública (sem se sustentar em nenhuma pesquisa, ou seja, só na opinião dele), enlameou a Câmara dizendo que “ela não tem mais força moral para impedir gestos que a desmoralizem”.
A seguir, chamou a indicação do deputado de “manobra petista para constranger o STF no julgamento do mensalão que se avizinha”.
Ou seja, tratou o Supremo Tribunal Federal como uma instituição factível de se influenciar pela força de um partido, num desafio nítido, cristalino, à imparcialidade de seus ministros.
Que o jornalista não goste do governo eleito – como não gostou do anterior – é um direito seu, no campo democrático da crítica. Que faça disso um argumento para decidir sobre culpabilidade, antes que a justiça se pronuncie, é um acinte aos poderes judiciais. Enquadrou o STF, insinuando que a suprema corte do país age aos ventos da força do Executivo.
Com a mesma voz, mas com uma rouquidão diferente, Augusto Nunes, em seu blog da revista Veja, termina seu texto dizendo “ O governo e o Congresso tentam constranger o STF com a absolvição simbólica dos mensaleiros”. Arvorando-se em paladino do bem e dos costumes,também enquadra a suprema corte com a afirmação de que “ a maioria dos ministros sabe que, se os chefões da quadrilha forem absolvidos, o STF terá optado pela rota do suicídio. Os partidários da capitulação precisam ouvir a voz do país que presta: se o Supremo avalizar a falácia segundo a qual o mensalão não existiu, o Judiciário deixará de existir como poder independente”.
O país que “presta!” é o da ficção que ele escolheu. O país de verdade, dos 56 milhões que elegeram Dilma, o do andaime e do guindaste, ele não conhece, preso no gabinete de onde vocifera.
Então: ao se referir a “ chefões da quadrilha”, já se antecipa a um julgamento, abusando inclusive de sua forma forma chula e rancorosa de escrever. E não deixa por menos a arrogância: se o Supremo Tribunal Federal não decidir à maneira dele, “deixará de existir como poder independente, entrará em rota de suicídio”.
Confesso que, como leitor de jornais e acompanhando política desde a puberdade, nunca li um delírio lacerdista desse porte.
O mosqueteiro que presta serviços à família Civita – e isso ele nunca poderá argumentar ser um insulto, já que trabalha para o grupo Abril e dele recebe seus salários - é corajoso porque tem por trás a força de um grupo editorial.
A ponto de ameaçar em seu blog os que dele discordam, com ações judiciais, publicando endereços de e-mails e “IPs” de seus desafetos.
Não faço aqui a defesa de envolvidos em “mensalões’, “falcatruas, “ bandidagens”. Também estou às voltas com o entendimento detalhado do que aconteceu na época da circo armado para derrubar Lula. Faço-o sem a influência de uma imprensa viciada. Não condeno só com base em indícios.
Escrevo pensando na maioria dos que escolheram a continuação de um governo que lhes fez bem. Não em nome deles, longe dessa pretensão.
Mas não acho certo alguns escribas contratados continuem, em nome de seus patrões, e com a força de seus veículos, ditando a verdade que lhes convêm nos espaços influentes que monopolizam.